The Port City of Matosinhos and Port of Leixões
Interview with Emílio BROGUEIRA DIAS, President of the Leixões Port Community

21 Giugno, 2023

A Cidade portuária de Matosinhos e o Porto de Leixões

Entrevista com Emílio BROGUEIRA DIAS, Presidente da Comunidade Portuária de Leixões

Antes de mais, quero agradecer ao Sr. Eng. Emílio Brogueira Dias, Presidente da Comunidade Portuária de Leixões, pela gentileza de me receber e aceitar esta entrevista para a revista PORTUS, por ocasião da realização do PORTRAIT de nº. 45, dedicado à cidade de Matosinhos e ao Porto de Leixões.
Quero também felicitá-lo pela sua nomeação como Presidente da Comunidade Portuária de Leixões e desejar-lhe os maiores sucessos na sua missão.

Emílio Brogueira Dias foi Presidente do Conselho de Administração da APDL durante entre 2012 e 2017, tendo sido simultaneamente Presidente da RETE durante esses 5 anos. Um percurso profissional que faz dele um conhecedor privilegiado do Porto de Leixões e da RETE e, por isso, um entrevistado essencial e de grande valor para os leitores da PORTUS.

Por fim, não posso deixar de reconhecer a grande amizade que me une a Emilio Brogueira desde há muito tempo: juntos, partilhamos momentos de grande importância na vida da Associação RETE, mas são sobretudo as memórias das situações vivenciadas e das relações pessoais desenvolvidas que me fazem sentir especialmente feliz e emocionado com esta entrevista, que volta a unir num novo outro contexto profissional. Obrigado Emílio, pela participação nesta entrevista.


ENTREVISTADOR | José Luis ESTRADA, Diretor de PORTUS

ENTREVISTADO | Emílio BROGUEIRA DIAS, Presidente da Comunidade Portuária de Leixões

Emílio, com a recente nomeação para Presidente da Comunidade Portuária de Leixões, quais são as principais mudanças sentidas no Porto de Leixões, neste “regresso” depois de deixar a Presidência da APDL em 2017?

Primeiramente dar conta que hoje em dia “navego” pela Comunidade Portuária de Leixões, que é uma Associação de direito privado, em que vários sujeitos estão envolvidos e participam [1] com o objetivo de perseguir juntos alguns objetivos específicos compartilhados [2].

É um facto que “deixei” o porto de Leixões em Setembro de 2017, foi um choque! – Não é fácil sentir que a vida mudou tão radicalmente aos 71 anos de idade, commais de 46 anos a trabalhar no duro em Leixões e 33 dedicados também ao ensino na Universidade do Porto.
É verdade e incontornável que aos 70 anos, tiram-nos o “chip” e somos “convidados” diria eu – obrigados – ao “dolce far niente”, e assistimos a um quase alheamento da sociedade, que poderia (sou suspeito!) tirar proveito da experiência acumulada e dos bons e maus resultados que a vida nos propiciou. Paciência! (c’est la vie).

Quais as principais alterações sentidas por mim, no porto de Leixões aquando do meu “regresso” em Março de 2022? – agora na Direcção da CPL – Comunidade Portuária de Leixões.
Muitas! Logo à partida estávamos a “reaprender a andar” tentando ultrapassar finalmente as vicissitudes que uma calamidade como a COVID e, por outro lado as agruras dum problema económico mundial, os quais vieram a provocar enormes alterações e dificuldades, em sectores tão vitais e tão carentes de permanente actualização e investimento, como é o caso da actividade portuária.
Um porto, como quase tudo na vida, carece de um guião, de ponderação e uma “cartilha” para se saber para onde se deve ir, que todos conheçam e possam ajudar a concretizar – Um Plano Estratégico!
Leixões sempre foi um bom exemplo, pois teve desde a sua criação, nos finais do Séc. XIX, esse guião – um Plano Director …, depois chamado de Fomento … , e finalmente Plano Estratégico. Este percurso sofreu também as contrariedades da instabilidade da altura e principalmente os efeitos nefastos dos “2 maus da fita” – o Covid e a falta de $$$.
Felizmente hoje já se está a ultrapassar esta borrasca e já se encontram em curso estudos conducentes a uma conveniente Actualização e Revisão do Plano anterior, que terá que procurar resposta eficaz à vitalidade e evolução meteórica do sector portuário, indicando o melhor caminho a seguir – a CPL – Comunidade Portuária colaborará com a Administração Portuária para se alcançar o êxito deste inadiável e estruturante objectivo, não esquecendo nunca a “sua cidade”, a incontornável sustentabilidade e a inestimável colaboração de Matosinhos e da sua Câmara Municipal.

Muitos outros aspectos mudaram “a pintura” do porto, a progressiva concretização da Plataforma Logística (em breve insuficiente para “as encomendas”), a confirmação duma actividade sempre em crescendo – a contentorização – e o confirmado crescimento da dimensão dos navios, cada vez maiores e maiores (mas não esquecer que a maioria que por aí andam, são “pequenotes” e vão ainda por aí andar muito tempo) e a confirmação da tão desejada e consolidada Intermodalidade dos Transportes, entre os transportes (o Marítimo e o Fluvial, o Rodoviário e o Ferroviário) convenientemente articulados com recurso a uma gestão digitalizada e áreas dedicadas, sempre insuficientes e caras para a procura.

Respostas, soluções e dinheiro (muito dinheiro) são premissas fulcrais e, precisa-se do novo Plano Estratégico para o porto de Leixões como “de pão para a boca”. Aguardamos e hoje estamos mais esperançados pois estamos convictos estar no bom caminho.

Vivemos tempos de grandes mudanças na sociedade em geral, com impacto nos transportes, na logística e nos portos. Como vê o Porto de Leixões no contexto nacional dos portos portugueses, e no contexto ibérico e internacional, agora que está do outro lado da barricada?

O mundo está sempre em permanente convulsão, a evolução e a inovação são constantes e fazem-se sentir também fortemente no sector portuário, a Digitalização é imparável e imprescindível, totalmente revolucionária nos procedimentos, alterando profundamente a nossa forma de viver.
Assiste-se a dinâmicas e alterações a uma velocidade estonteante, “o que hoje é verdade amanhã é obsoleto e já não é bem, assim …”, Os portos, como é o caso de Leixões, e como já referido, tem que dar a resposta possível e impossível para movimentar navios cada vez maiores, mas também os Guindastes e Pórticos cresceram desmesuradamente, quem se lembra das velhas e glamorosas “Cegonhas” que, no 1º quartel do Séc. XX, movimentavam “estonteantes”cargas comcerca de 3 toneladas – hoje os seus filhotes/sucedâneos ultrapassam as 100 toneladas!!
O mesmo se poderá dizer dos meios de movimentação em terra, pois os cais e terraplenos foram dimensionados para suportarem 3 a 5 ton/m2 e têm hoje mais que quadruplicar essa capacidade de suporte – não há milagres?! É preciso reforço das estruturas e manutenções mais frequentes das infra-estruturas, para já não falar da constante alteração das ferramentas informáticas, que hoje gerem e comandam todo o processo (como eu costumo dizer, o meu computador e telemóvel, ao fim de poucos anos estão caducos e eu que até já pensava que já dominava estas ferramentas, voltemos de novo à aprendizagem … “no comments”!).

Leixões tem conseguido, nem sempre com o timing e a velocidade certos e pretendidos – já repararam que as pessoas hoje são muito mais impacientes, querem tudo para ontem – “não dão tempo ao tempo”. Como dizia, Leixões tem acompanhado estas alterações e procurado respostas adequadas – hoje concluiu o Rebaixamento dos Fundos do Canal de Entrada e Aumento da Bacia de Rotação interior, e vai muito adiantada a Obra do Prolongamento de mais 300m do Quebramar exterior.
Continua a investir fortemente na Formação interna e de toda a Comunidade Portuária, e tem sido bem secundada pelos seus Operadores e Concessionários que têm adquirido novo, mais potente, moderno e mais sustentável equipamento, para a operação portuária, por outro lado a APDL continua na senda da concretização de mais Cais e Terraplenos, maiores e commais capacidade, para fazer face ao movimento já existente e esperado.
Não é tarefa fácil e barata, pois tratando-se dum porto totalmente artificial, encaixado pela sua cidade, mas, como sempre e coma ajuda de todos os intervenientes e parceiros, conseguirá ultrapassar as dificuldades e encontrar as melhores soluções dentro dos vários projectos já existentes e/ou em curso para toda a tipologia de cargas e, tudo devidamente encaixado e harmonizado no seu novo Plano Estratégico – espera-se que em 2023.

Ponte movel de Leixões (liga dois polos da cidade-Matosinhos e Leça da Palmeira).

Este porto não esquece o papel essencial que desempenha no País e nas zonas mais próximas da amiga Espanha, a Norte e a Leste de Portugal, sendo determinante no seu alargado hinterland, reconhecido como a unidade das mais relevantes no impacto no tecido empresarial e industrial, bem como na distribuição e logística da cidade, do País e da Região Europeia onde se insere, tanto na Importação como na Exportação.

Não se pode deixar de referir um episódio inesperado que veio criar imensa entropia e provocar insuperáveis alterações que estão a ser estudadas e “digeridas”. Trata-se da decisão intempestiva do fecho da Refinaria de Matosinhos (uma das 2 únicas em Portugal, a outra está em Sines). Movimentava todos os produtos através de uma rede nova de pipelines, pelo porto de Leixões (cerca de 1/3 da carga geral aí movimentada!), tendo um impacto na facturação da empresa muito relevante para o equilíbrio da APDL. Também “no comments”!!

Na sua opinião quais são os principais pontos fortes e as limitações de uma Comunidade Portuária?
Que papel acha que as Comunidades Portuárias devem desempenhar em relação às Autoridades Portuárias e aos portos? Como valoriza esse papel?

Sem dúvida a riqueza da abrangência holística dos parceiros da CPL, tal como já referido anteriormente é constituída por representantes de praticamente todos os sectores e agentes intervenientes no porto de Leixões, nas diversas funções aí desempenhadas, com muito saber e experiência, desde a Administração portuária, passando pelo tecido Empresarial, pelos Operadores e Concessionários portuários, aos Sindicatos, aos Transportadores, aos sectores da Navegação/shipping, aos serviços Aduaneiros, sectores da Logística e distribuição, etc…

Não existe na CPL, assim, praticamente nenhum sector em falta e são ricas e diferentes as perspectivas e, por vezes, os interesses de cada um, mas quando “toca a rebate” todos “vestem a camisola” e defendem o seu porto, sem nunca perder o Norte – ou seja, a razão de ser de cada um dos parceiros.
Acresce que a CPL congregando as diferentes opiniões, tem a possibilidade de desempenhar um papel agregador e ser um parceiro importante, detendo saberes e procurando chegar sempre a um consenso, o que lhe facilita aconselhar a opção pelas melhores soluções e ser parte activa na resolução de problemas que são tão frequentes numa actividade tão importante e interesses tão diversos.

O que mais o impressiona atualmente na Comunidade Portuária de Leixões e na sua relação com a APDL?

A forma mais simples de responder seria apenas referir que a CPL ultrapassou já os 25 anos de existência, continua activa e solicitada para participar nas principais decisões e acções em curso no seu porto.
Esperamos sinceramente que a instabilidade e desnorte vigente no mundo, com nefastos reflexos na economia global, não impeçam a continuação da paz laboral que sempre reinou em Leixões, e/ou venha a dificultar a concretização dos projectos em elaboração e os que surgirão para responder aos desafios, como já referido, num sector tão dinâmico e importante, diria vital, para a Cidade, a Região e para o País.

Do seu ponto de vista como vê a relação entre o Porto de Leixões e a cidade de Matosinhos?

Poderia retratar a relação entre a Câmara de Matosinhos e o Porto de Leixões, sem qualquer esforço de retórica e cominteira verdade através da frase simples e lapidar – “A cidade gosta do seu porto e o porto gosta da sua cidade”.

Estive mais de 4 décadas a trabalhar no porto de Leixões, tendo tido sempre actividades muito próximas das atribuídas às autarquias, acompanhei de perto mais de 1/2 dúzia de Presidentes da APDL e outros tantos da Câmara de Matosinhos. O cômputo geral é francamente positivo, como tudo na vida e na natureza com momentos mais pacíficos e outros mais agitados, nem tudo foi e será “um mar de rosas”, mas sempre se soube de parte-a-parte encontrar dose suficiente de bom senso e interesse comum, conducentes a uma solução consensual, para ultrapassasse os tempos menos “bonançosos”.

São inúmeros os casos e exemplos de parcerias, trocas e cedências das 2 partes, mas a paciência e a amizade do JL Estrada não são infinitas, e não me deixaria elencá-las exaustivamente.
Desculpa mas apenas vou referir alguns casos, à partida a revolução total da mobilidade na cidade, com a construção pela APDL duma única portaria para pesados (existiam 5 espalhadas pela cidade) e para a execução de 3 km de estrada dedicada, fora das vias municipais, que liga directamente o porto à rede fundamental de auto-estradas nacionais – a VILPL, via interna de ligação ao porto de Leixões, que também articula e serve a Plataforma Logística.
O novo Terminal de Cruzeiros (obra merecedora de vários prémios de arquitectura – e que hoje conjuntamente com os Titans constitui mais um “ex-libre” de Leixões, Matosinhos e Leça), as Marginais costeiras de Matosinhos e Leça (pela mão de 2 prémios Pritzker), as lindíssimas Quintas da Conceição e de Santiago, em Leça da Palmeira, e hoje geridas pela autarquia e usufruídas por toda a população, a Casa da Arquitectura, a abertura do porto à Cidade (dia do porto e acções, divertimentos, corridas, muito participadas pelos habitantes da cidade e região), a viabilização de 70 ha para instalar a Plataforma Logística de Leixões, bem como a permissão da penetração do términus da rede da Metro do Porto, etc …

Outra referência que se poderia citar é que, mesmo para quem está de fora, como é o caso da RETE, sempre foi apontada como um exemplo de sucesso e de um caminho conjunto de crescimento e articulação, o de Matosinhos/Leça e Leixões.

Nos últimos tempos a RETE perdeu alguns dos seus antigos parceiros e associados em Portugal. Que estratégias considera que podem ser desenvolvidas para os recuperar e para atrair novos?
O que acha que pode ser feito para que Portugal recupere o seu protagonismo na Associação?

Nos tempos que correm e com as dificuldades porque todos passam, este aspecto é um dos mais negativos e muito penalizador para a RETE. Não tenho nenhuma “solução mágica na cartola, nem na manga”, mas ao longo deste meu estendido arrazoado já fui dando algumas pistas e achegas para voltarmos à origem identitária da nossa organização, tem que se revitalizar e re-humanizar o nosso funcionamento, recuperando e inovando algumas das acções que tanto êxito tiveram e permitiram à RETE chegar aqui.

Há que “meter os pés ao caminho”, ir ao encontro das pessoas e das organizações, mostrar o que é e para que serve a RETE, o interesse em participar, organizar Encontros, Palestras, Cursos e Debates nos diversos sítios e países e animar as pessoas a participar, escrevendo textos, sugerindo temas e matérias a abordar, apontando problemas onde a RETE possa ser parceira.

“Que o mar seja de bonança e que os ventos soprem de feição” – a RETE é precisa, tem o seu lugar ímpar e sobreviverá.


IMAGEM INICIAL | Vista sobre a cidade de Matosinhos e o porto de Leixões.


NOTAS

[1] A Comunidade Portuária de Leixões tem como principais parceiros e associados a quase totalidade de quem trabalha, gere e tem responsabilidades em Leixões, nomeadamente:
• APDL – Administração dos Portos do Douro e Leixões;
• AOPPDL – Associação dos Operadores Portuários dos Portos do Douro e Leixões;
• AGEPOR – Associação dos Agentes de Navegação de Portugal;
• APAT – Associação dos Transitários de Portugal;
• ANECAP – Associação Nacional das Empresas de Estiva Concessionários de Áreas Portuárias;
• AEP – Associação Empresarial de Portugal;
• ACP – Associação Comercial do Porto;
• AAMC – Associação dos Armadores da Marinha Mercante;
• ANTRAM – Associação Nacional dos Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias;
• ODO – Ordem dos Despachantes Oficiais;
• SEC PDL – Sindicato dos Estivadores, Conferentes e Tráfego dos Portos do Douro e Leixões.

[2] Objectivos da Comunidade Portuária de Leixões:
• Fomentar o desenvolvimento do porto de Leixões;
• Contribuir para a racionalização, eficiência e desburocratização dos procedimentos administrativos ( hoje c/um foco especial na digitalização de todos os procedimentos);
• Promover a racionalização das áreas e estruturas existentes;
• Promover a articulação com os restantes portos nacionais;
• Promover a Intermodalidade;
• Promover o desenvolvimento da Navegação;
• Projectar o porto de Leixões de forma a torná-lo uma referência para as Cadeias Logísticas da fachada atlântica da Península Ibérica;
• Colaborar c/a Administração Pública e com o Poder Legislativo nos procedimentos referentes à actividade portuária, designadamente de cariz legislativo.



Article reference for citation:

ESTRADA, José Luis. “A Cidade portuária de Matosinhos e o Porto de Leixões. Entrevista com Emílio BROGUEIRA DIAS, Presidente da Comunidade Portuária de Leixões”. PORTUS | Port-city relationship and Urban Waterfront Redevelopment, 45 (June 2023). RETE Publisher, Venice. ISSN 2282-5789.
URL: https://portusonline.org/the-port-city-of-matosinhos-and-port-of-leixoes-interview-with-emilio-brogueira-dias/

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